Especialistas garantem que educação financeira e tecnológica podem ajudar a reduzir golpes contra grupo 60+
Em janeiro de 2022, a aposentada Maria Machado Cota, de 75 anos, recebeu uma ligação de uma pessoa que afirmava ser do setor de expedição de uma grande varejista. “Estou com ordem de serviço de compra de uma TV de 40 polegadas no seu nome. Não realizou a compra? Ah, então a senhora caiu em um golpe e precisa ligar para o seu banco”, disse o homem do outro lado da linha. Maria ligou para o número que constava no verso do cartão do banco e ficou por horas ao telefone com uma atendente. O que ela não imaginava era que estava conversando, na verdade, com uma golpista, enquanto suas quatro contas bancárias eram varridas por uma quadrilha.
Entre compras feitas no cartão de crédito e retiradas, no total os bandidos deram um prejuízo de R$ 42 mil. Até hoje, Maria não sabe como eles conseguiram driblar os sistemas de segurança dos bancos. “Ali começava a minha via crucis para reaver o dinheiro. Primeiramente, a dificuldade para registrar um boletim de ocorrência, depois para conseguir a devolução nos bancos”, relata Maria, que é presidente da Rede Ibero Americana de Associações de Idosos do Brasil (Riaam-Brasil) e sabe muito que seu caso está longe de ser uma exceção entre as pessoas com mais de 60 anos no país.
O número de golpes aplicados contra os idosos disparou em todo o Brasil em 2023. No primeiro semestre deste ano, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) registrou 21.249 casos de violência patrimonial contra pessoas com mais de 60 anos, número que é 76,9% maior do que foi compilado durante o mesmo período do ano passado. Estamos em outubro, e a pasta já recebeu 34.744 denúncias dessa natureza desde janeiro – quase 30% a mais do que foi registrado ao longo de todo ano de 2022.
Todo mundo, de qualquer idade, é suscetível a ser vítima de estelionatários, mas as quadrilhas tendem a focar nas pessoas com mais de 60 anos porque este grupo pode ter menor familiaridade com as novas tecnologias ou demonstrar ter pouca desconfiança durante as abordagens.“As pessoas mais idosas gostam muito de conversar, é uma cultura antiga. Imagina esse pessoal numa pandemia, sem poder sair de casa, aí liga uma pessoa e pergunta como ela está, como está o joelho dela… Ali vai criando uma rede de confiança até ela passar os dados pessoais. Mas, na verdade, não é um funcionário do banco, é algum golpista”, explica Marcelo Barbosa, coordenador do Procon Assembleia.
Segundo o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa do MDHC, Alexandre da Silva, a pasta tem trabalhado em diferentes frentes para minimizar o grande número de golpes aplicados contra pessoas com mais de 60 anos – os principais alvos das quadrilhas. Além de dialogar com instituições bancárias e órgãos públicos, a secretaria acredita na importância da educação financeira e tecnológica para que os idosos estejam mais preparados para não serem alvos dos bandidos.
“Temos feito um projeto com a Universidade de Brasília (UnB) para a inclusão das pessoas com mais de 60 anos no meio digital. Queremos um letramento digital, com ações que visam o enfrentamento de tudo que pode vir ali escondido atrás de um golpe ou uma fake news. Quando tivermos os primeiros resultados (do projeto), vamos ampliar para outras regiões”, explica o secretário, lembrando que a pasta pretende incentivar o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a ter mais atendimentos presenciais e humanizados, para que aposentados fiquem menos vulneráveis a golpes.